Por que mudar a rotina digital, como começar a mudá-la, será que vale a pena?

Diariamente, o usuário médio é influenciado pelo conteúdo digital que ela consome, mas ainda mais importante, pela forma como ela o consome. Notícias, opiniões, discussões, entretenimento: tudo é apresentado de maneiras diferentes através da Internet e ainda assim poderia ser dito que a experiência on-line de muitos usuários está globalizada. O discurso assumido por trás desta dinâmica está na "facilidade" de uso de algumas plataformas que ditam o ritmo da rede. É tido como certo (porque de fato é freqüentemente repetido em seus slogans) que o que usamos é a opção fácil, de modo que deve haver, perdida entre as infinitas opções da Internet, outras opções mais complicadas. E-mails mais complicados, redes sociais mais complicadas, sistemas operacionais complexos... Por que procurar as opções que não são as "fáceis"? Esta suposição chegou até nós sem qualquer crítica, assim como se supõe que alguém que queira consultar a data de nascimento de seu ator favorito deve ir ao Google, ou mesmo perguntar em voz alta ao seu telefone. É verdade que o que usamos em nossos computadores e telefones celulares são as opções fáceis?

Depois de vários atropelos à lei pelos gigantes digitais (GAFAM: Google, Amazon, Facebook, Apple, Microsoft) em vários países, também foi amplamente assumido que o nível de privacidade ou, em geral, o respeito aos direitos dos usuários sobre suas informações digitais é questionável. Entretanto, isto não impediu que seu discurso de facilidade de uso fosse inquestionável para a maioria dos usuários. Uma visita à porta fechada a um centro de distribuição da Amazônia na Espanha recebe os visitantes com uma grande placa que diz "trabalhe duro. divirta-se" e dentro de todos fica muito feliz em trabalhar lá. Pelo menos é isso que o guia lhe diz várias vezes durante a visita, embora vários trabalhadores façam as malas de pé e corram pelos corredores, você não fala com mais ninguém. O espírito do Google é semelhante, cores, desenhos, "boas vibrações", mesmo que eles tenham tido vários problemas com seus trabalhadores propondo a criação de sindicatos em sua sede nos EUA. Por que questionar nada disso? Eles são a opção "simples", ao contrário da opção complicada e desconhecida.

Os serviços e soluções digitais apresentados por várias destas empresas desculpam a maioria de seus problemas opacos no cuidado dos usuários, em seu esforço para projetar o que é rápido, fácil e barato. Dentro deste cuidado, não há espaço para o cuidado de minorias que não se conformam com seus padrões (às vezes seus próprios trabalhadores, por exemplo), não há espaço para a construção do autocuidado (tudo tem que passar por seu filtro panóptico onde todas as informações do usuário devem ser transparentes aos olhos do sistema, mas seu código e políticas são opacos), não há espaço para participação e votação em mudanças futuras. Eles se apresentam, entretanto, como uma opção comprometida com sua vida, seu conforto e seu bem estar. Seu paternalismo é apontado como uma virtude, mas não é transparente; ele depende inteiramente da confiança cega dos usuários, algo que só pode ser alcançado com tal "feel-good" marketing, especialmente após os vários problemas legais com seus maus tratos de dados e trabalhadores.

Olhar para fora da janela das alternativas é vertiginoso. Como poderia não ser? Constantemente nos é dito que a alternativa é complicada, demorada, tecnicamente exigente, insegura e uma série de outras complicações. Além disso, há uma pressão constante de que a adoção de uma alternativa a um serviço o obriga a fazê-lo com todos, um contrato de sangue absoluto. Todos estes são mitos que se espalharam tanto entre usuários comuns quanto em algumas comunidades que estão organizadas em torno do desenvolvimento de serviços alternativos. Nem a alternativa ao GAFAM é complicada por definição, nem a mudança na rotina tem que ser absoluta para ser legítima e coerente. Infelizmente, em um contexto onde o dinheiro dá visibilidade, as alternativas permanecem escondidas, esperando que os curiosos e as comunidades lhes dêem uma chance.